Excerto de «Turista Clandestino», in Tautologias.
E no centro de cada quarto, no centro do universo inteiro, permaneci a ensaiar a agrura do silêncio monástico. O isolamento. A dúbia doçura da paz. Habitei cada um, não sei quanto tempo, a pensar muito, não sei em quê, talvez na insuficiência do pensamento, ou no seu excesso. Pensei muito pouco. Que se pensa num convento quando já não se considera rezar? A que inevitável incompletude se está votado quando os séculos se nos atravessam sem ordem e a nossa pequenez já não advém da desmedida de Deus mas de nos vermos sem ele, sem a sua medida, sem o seu totalitário mas finito reino? E ali, perdido, era como se na convicção da minha descrença se reunissem todas as palavras, todo o silêncio, e nessa mútua aniquilação eu apenas me pudesse encontrar absoluto, já sem voz, corpo ou vida. Inexistente.