4 de abril de 2019

Os Animais e o Dinheiro, de Gonçalo M. Tavares e Os Espacialistas. O espetáculo aconteceu no Rivoli, um edifício que me suscita a ideia de uma monumentalidade em ponto pequeno. Os mármores, as luzes, a polidez, a amplitude dos espaços ainda de quando havia espaço para o espaço por dentro da cidade. Mas o espetáculo. O espetáculo era de um efeito iminentemente físico, corporal, como se fossemos tragados pelas iterações circulares e hipnóticas da máquina. Uma hora de constância, de não movimento num ininterrupto movimentar. O pensamento dá-se à indolência do corpo e tudo o que somos e tudo que o espetáculo é e tudo o que está a ser, fica simbioticamente unificado mitigado expandido à simplicidade de uma coisa maior. Uma hora. Uma hora. Uma hora. Num súbito, explode música devasta o funcionamento da engrenagem, a máquina para como se acordada para uma nova realidade nova consciência do espaço do tempo. E há luz, cor, muito tempo de luz, cor, música, e o corpo novamente se dá ao ritmo e à circularidade, mas, desta vez, em êxtase da adrenalina do orgasmo imprevisto. Há muito a intelectualizar. Mas o que o espetáculo dá de incomum é uma consciência profunda de estar ali num corpo por baixo da inteligência, só em contacto terreno com o que há de físico em nós. Mas talvez seja isso uma forma de intelectualizar a questão.  

15 de março de 2019

Ali perto, no fim da Rua das Virtudes, do lado direito, há um chafariz. Ao lado da estrutura está plantada a sua mneumobiografria: um parágrafo em português, outro em inglês. Uma chapa vermelhíssima, mesmo ao centro da cinzenta construção, acautela: água não potável, apenas em português. Desconcertado, pensei se supomos serem os estrangeiros espertos demais para beberem daquela água ou se a prevenção da sua intoxicação extravasa as competências camarárias.

1 de março de 2019

O carnaval aproxima-se da sua febre. As lojas distribuem fogo e cores.

As máscaras carnavalescas requerem pouco cálculo interpretativo. São uma ideia acabada, o seu sentido é espontâneo. Na sua imagem morre a psicologia.

15 de janeiro de 2019

Não quero deambular pela amplitude funesta do que digo ou não digo, o que escrevo ou não escrevo, o que sou ou não sou. Tenho na ideia um texto mais para o narrativo — tenho pensadas as personagens, o espaço da ação, o Tema mais ou menos delineado. Vai dar uma trabalheira. Uma coisa angustiante esta de manipular a psicologia de alguém. Dizem-me naturalmente, e sensatamente: mas as personagens não existem, são um produto de uma puríssima invenção, uma matéria que vem de parte nenhuma. Eu devia ser mais sensato.